Na França, a erosão da legitimidade em um modelo paternalista
- Carlos Dias

- 1 de set.
- 3 min de leitura

A França, nação que historicamente se posicionou como um denso bastião de um modelo de bem-estar social, encontra-se hoje imersa em uma crise ampla que transcende o mero desequilíbrio conjuntural. O cenário atual é o reflexo direto de uma política fiscal expansionista e, sobretudo, paternalista, que viciou a sociedade na dependência estatal e, em última instância, comprometeu a própria solvência soberana do Estado e a sustentabilidade intergeracional de suas contas públicas. Os dados revelam a gravidade da situação: no primeiro trimestre de 2025, a dívida pública francesa alcançou a imensa cifra de €3,345 trilhões, correspondendo a impressionantes 113% do Produto Interno Bruto (PIB). Este patamar, por si só, já sinaliza uma deterioração severa da capacidade de pagamento do Estado. Soma-se a isso um déficit orçamentário que, em 2024, atingiu 5,8% do PIB – um valor que praticamente dobra o limite de 3% estabelecido pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento da União Europeia. O Fundo Monetário Internacional (FMI), em alerta contundente emitido em maio de 2024, já havia projetado que a dívida francesa poderia alcançar 112% do PIB em 2024, com uma trajetória ascendente de 1,5 ponto percentual ao ano no médio prazo. Essa projeção, aliada ao cenário atual, culminou na dívida atingindo 113% do PIB no primeiro trimestre de 2025, confirmando a preocupante escalada do endividamento, caso não sejam implementadas medidas fiscais de consolidação urgentes e profundas.
Este endividamento descontrolado é a consequência direta de décadas de políticas estatais que priorizaram a socialização dos custos e a distribuição de benefícios em detrimento da disciplina fiscal e da alocação eficiente de recursos. A lógica paternalista, ao buscar atender a todas as demandas sociais por meio de subsídios, transferências e um funcionalismo público inchado, gerou um “vício” na população, criando uma dependência insustentável do aparato estatal. Este modelo, embora politicamente atraente no curto prazo, inibe o investimento privado, desincentiva a inovação e distorce os incentivos econômicos, comprometendo o crescimento econômico sustentável e a competitividade da nação no cenário global. A fatura das políticas fiscalmente irresponsáveis começa a ser cobrada. Para mitigar um rombo estimado em quase 4 bilhões de dólares, o governo propôs medidas de austeridade que incluem cortes de feriados, a redução de cargos no funcionalismo e a revisão de benefícios sociais e aposentadorias. Contudo, tais iniciativas são percebidas como tardias e insuficientes pela opinião pública, que manifesta uma profunda crise de confiança na capacidade do governo de reverter o quadro.
Mais de 80% dos franceses expressam o desejo pela saída antecipada do presidente Emmanuel Macron, cuja aprovação despencou para um mínimo histórico de 19%. O primeiro-ministro François Bayrou segue a mesma tendência, com apenas 18% de apoio, consolidando o par mais rejeitado da Quinta República. Esta expressiva perda de legitimidade política reflete o desencanto da sociedade com um modelo que, prometendo segurança e bem-estar, entregou endividamento e a necessidade de dolorosos ajustes. A fragilidade interna da França projeta-se, ainda, no cenário internacional. As críticas abertas do vice-primeiro-ministro italiano, Matteo Salvini, que acusou Macron de utilizar discursos belicistas, como a possibilidade de envio de tropas para a Ucrânia, como uma cortina de fumaça para sua impopularidade interna, ilustram o crescente isolamento e a perda de prestígio internacional da liderança francesa. A reação formal do Palácio do Eliseu, ao convocar a embaixadora italiana, não disfarça o desgaste que já se manifestava entre importantes setores, como empresários e executivos, e até mesmo entre eleitores de Macron de 2022. A situação da França, com seu governo acuado entre a obrigatória necessidade de saneamento fiscal e a galopante perda de legitimidade política, é um exemplo contundente das consequências inevitáveis de um modelo de Estado paternalista. O pleito de 8 de setembro, com a moção de desconfiança contra François Bayrou no Parlamento, não será apenas um teste político, mas um momento decisivo que poderá redefinir os rumos de uma nação que precisa urgentemente reequilibrar suas contas e reformular a relação entre Estado e sociedade para garantir sua prosperidade futura.
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